sábado, 15 de outubro de 2011

O lixo extraordinário de Hoboken

15/10/2011 | 09:00 | MULHERES PELO MUNDO | ATUALIDADES |

Hoje, no Mulheres pelo Mundo, a jornalista e escritora Martha M. Batalha fala do lixo de seus vizinhos novaiorquinos.

Como 90% das pessoas que se consideram novaiorquinas, eu não moro em Manhattan. Funciona assim: com a chegada do primeiro filho, é preciso decidir entre pintar o closet de rosa para abrigar a neném ou se mudar para um lugar maior. Acontece que Lugar maior e Manhattan só coexistem na mesma frase na cartilha dos milionários. Eu moro em Hoboken, uma cidade do outro lado do Rio Hudson que tem mais ou menos o tamanho (e a renda per capita) de Ipanema. Hoboken ainda é muito rica. Uma riqueza que está nas Ferraris que volta e meia passeiam pelas ruas, nos aneis de brilhante das americanas que pegam o onibus comigo e, principalmente, no lixo da cidade.

Por ter os olhos nascidos e criados em outra cultura, e por ser casada com um cubano/portorriquenho cuja tia-avóo ainda mora na ilha e faz pudim em uma lata de tomate cortada ao meio, eu não consigo passar pelas ruas de Hoboken sem me impressionar com o lixo. São computadores, TVs, sofás, colchões, cadeiras (vejam as fotos no final do post). O americano joga estas coisas na rua com a facilidade que um brasileiro joga papel de bala. No Brasil, eu tirava da panela as sobras de comida e colocava em um saco plástico antes de jogar fora porque sabia que alguem poderia revirar o lixo e fazer daquilo uma refeição. Aqui, eu vejo a panela no lixo.

Um tempo atrás decidimos trocar nossa TV e, em vez de jogá-la no lixo como os nossos vizinhos, a levamos até o Exército da Salvação, que aceita doações e as revende a preços simbólicos. Quando chegamos, havia um cartaz na porta:

- A partir de agora só aceitamos computadores e TVs de tela plana.

Quando os pobres de um lugar só aceitam doações de TVs de tela plana, quando os aneis de brilhante de quem anda de ônibus são verdadeiros e quando a gente tem medo de manobrar o carro porque pode tocar uma Ferrari é porque a palavra remediado não faz parte do cotidiano do lugar.

Não acho que os americanos sejam piores do que nós porque jogam tudo fora. Só acho que nasceram em outro mundo. O mundo fantástico dos recursos naturais eternos e dos cartões de crédito infinitos. Nós, brasileiros, também cometemos nossos pecados de consumo. Mas, além de consumirmos menos, é dificil ver o que se joga fora, porque existe uma imensa rede de empregadas domésticas, orfanatos, ONGs e asilos, que absorvem o supérfluo descartado.

Porque era dificil de acreditar em tantas coisas jogadas fora, eu passei a fotografar. E divido as fotos aqui, para que vocês tambem achem dificil de acreditar – e por isso tenham que ver.

@marthambatalha

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